Episode Transcript
[00:00:07] Speaker A: Sejam muito bem-vindos a mais um podcast do Automóvel Clube Portugal. Eu sou o Francisco Costa Santos e hoje vamos falar sobre automóveis clássicos, mais especificamente sobre a sua importância cultural e histórica. E para nos esclarecer sobre este tema temos o Luís Cunha, responsável pelo ACP Clássicos, que nos vai contar aqui muito sobre esta história e sobre o que é que torna um automóvel num clássico e qual a sua importância. Luís, antes de mais, muito obrigado. E começamos mesmo por aí. Na sua opinião, o que é que torna um automóvel clássico mais do que um objeto mecânico?
[00:00:42] Speaker B: É curiosa essa pergunta porque há várias designações de automóvel clássico, mas aquilo que tratamos são de veículos de interesse histórico, onde os clássicos se incluem.
[00:01:04] Speaker B: E o conceito clássico é muito abrangente.
[00:01:08] Speaker B: Hoje em dia temos alguns carros muito especiais, atuais, que consideramos que são clássicos instantâneos. Não têm a idade que é suposto um veículo de interesse histórico ter, que são os 30 anos, mas são carros que irão ser peças de coleção ou nascem como peças de coleção.
[00:01:31] Speaker A: Que nascem já com um propósito diferente.
E não é só essa idade. Esse propósito assenta no quê, Luís?
[00:01:39] Speaker B: Os vínculos históricos?
[00:01:40] Speaker A: Sim.
[00:01:41] Speaker B: Pois, a idade é a condição primeira, digamos assim. A definição A definição internacional daquilo que é um veículo de interesse histórico nasceu de um acordo entre a FIA, a Comissão Histórica da FIA e a FIVA. A definição é essa que tentou ser o mais decorada possível, o mais simples possível. para que o conceito não causasse grande dúvida e foi apresentada à Comissão Europeia, adotada pela Comissão Europeia e hoje vigora em quase todos os países do espaço europeu.
[00:02:20] Speaker A: E a importância de clubes como o ACP de terem a oportunidade de ter sócios com automóveis com bastante interesse e de os trazerem para a rua, de os trazerem para fora, qual é a importância de celebrar estes eventos?
[00:02:34] Speaker B: Os eventos que que o ACP em particular organiza, acabam por ser um museu vivo, um museu sobre rodas. Portanto, levamos o museu às partes mais improváveis do país e tenho uma curiosidade interessante, é porque é um museu custeado pelos próprios proprietários. Portanto, não tem qualquer custo adicional para o Estado, nomeadamente. E daí consideramos que é um dos aspectos determinantes para que os veículos históricos sejam bem tratados e sejam reconhecidos como parte integrante da nossa herança cultural. Aquilo que a nossa civilização é hoje, muito deve ao advento do automóvel. Se não tivesse havido o automóvel, as coisas seriam diferentes. Podiam ser melhores, podiam ser piores, mas diferente eram seguramente. Portanto, há que, nestes tempos em que os automóveis têm as ameaças, como todos sabemos, nomeadamente os automóveis à combustão, porque é disso que se trata, não é? Por enquanto, daqui a 30 anos, podemos estar a falar de veículos históricos elétricos. Aliás, é preciso notar... Já existe algum?
[00:03:51] Speaker A: Podemos já definir algum automóvel elétrico?
[00:03:54] Speaker B: Há vários, porque nos fins do século XIX, princípio do século XX, Aquilo que se reconhece hoje como um automóvel tinha várias formas de motorização.
Veja-se no London Brighton, a célebre prova que decorre no Reino Unido que liga Londres a Brighton. em cerca de 98 km, portanto em milhas, ou cerca de 60 milhas.
E essa prova celebra aquilo que se chamava a Lei da Bandeira Vermelha, que hoje olhamos aquilo com grande espanto, porque os primeiros automóveis a circular no Reino Unido eram obrigados a levar à sua frente um homem que agitava uma bandeira vermelha para chamar a atenção daquela máquina infernal que alinha. E isto teve um impacto muito grande no desenvolvimento do início do automóvel no Reino Unido, comparativamente com países como França, que o desenvolvimento foi muito mais rápido.
E quando essa lei absurda terminou, eles organizaram uma prova que ainda hoje se mantém, o London Bright and Run, Em.
[00:05:11] Speaker A: Que ano, Luís, é que começou?
[00:05:13] Speaker B: Eu agora não tenho bem a certeza, mas como os automóveis admitidos no London Brighton é até 1904, não devo errar muito se disser que essa obrigatoriedade acabou em 1904.
E fizeram essa prova cumulativa e é uma prova que, desde essa altura até aos dias de hoje, teve só interrupção na Segunda Guerra, e penso que não foi nos anos todos, e depois também um ano na pandemia, Salveiro, portanto tem tido uma continuidade fantástica.
Isto para dizer o quê? Que nessa prova participam automóveis a vapor, participou de móveis elétricos e, obviamente, a combustão. Houve um modo de combustão na altura... Era mais um. E acabou por ser aquele que, nas condições que havia na altura, se viria a ter o sucesso que nós sabemos. Claro.
[00:06:05] Speaker A: Pelas vantagens que conhecemos, atualmente, ainda hoje, a eletricidade enfrenta muitas... E, portanto, obviamente.
[00:06:12] Speaker B: Que um automóvel elétrico, na altura, teria umas limitações que hoje já foram ultrapassadas, mas o certo é que nos primórdios do século XX houve automóveis elétricos, portanto não é uma novidade.
[00:06:23] Speaker A: Que os automóveis tenham a eletrificação. Mas Luís, perguntava numa visão mais atual. Há algum automóvel elétrico, por exemplo, quem impulsionou todo este mercado, já que falamos de elétricos, foi a Tesla. Será que o Model S poderá ser.
[00:06:38] Speaker B: Não, eu diria, antes do Moda Lesso, o Roadster, que já anda no espaço. Acontece aos 30 anos, em 2008. E o tempo passa muito depressa, já não falta tanto tempo.
Quando esse modelo tiver 30 anos, seguramente é um modelo muito representativo daquilo que é a eletrificação dos automóveis, não é? Portanto, sem dúvida que os automóveis elétricos, aos 30 anos, estarão representados nisto que é o universo dos veículos históricos.
[00:07:09] Speaker A: Já que falamos de futuro e de presente, porque atualmente estamos num panorama completamente diferente, A questão de termos tantos carros elétricos não reforça os argumentos dos clássicos num sentido histórico, de uma evolução histórica de como é que começaram, como é que vão. Os carros de interesse histórico não terão cada vez mais argumentos e valor associado por causa disso.
[00:07:31] Speaker B: Eu diria que, do ponto de vista cultural, é cada vez mais únicos. Cada vez mais únicos, claro. E a isso representam as várias décadas dos automóveis, dizem muito daquilo que foi a evolução.
da nossa sociedade.
Podemos fazer uma comparação, uma analogia com a arquitetura. Há períodos de arquitetura e falando...
[00:08:00] Speaker A: É preciso dar um tempo.
[00:08:03] Speaker B: Isso é um dos pontos importantes para se perceber que a evolução do automóvel está muito ligada à evolução daquilo que foi o nosso modo de vida. É muito importante que isso se mantenha e ao manter é preciso ter em conta que o propósito do automóvel é circular na estrada. Circular no meio para o qual foi feito. Portanto, não nos agrada nada a ideia que estes automóveis tenham restrições ao nível de terem que ficar nas garagens e nos museus. Não é isso que queremos e lutamos para que isso não aconteça porque neste momento e numa altura em que há uma grande sensibilidade naquilo que toca à questão das emissões, obviamente que estes carros, nós temos noção que estes carros são muito poluentes se circulassem aquilo que circula um automóvel de uso corrente, diário.
Mas isso, há dados, há estudos. A FIVA, de 7 em 7 anos, faz um estudo desses. A própria S&P este ano fez um estudo desses, que também vai ao encontro dessa perceção que há. E, portanto, é uma certeza.
Estes alunos têm um uso esporádico.
[00:09:18] Speaker B: Uma grande maioria faz bastante menos de mil quilómetros por ano. E, portanto, isso não tem qualquer expressão, não tem qualquer influência naquilo que é a defesa do meio ambiente.
[00:09:33] Speaker A: Luís, sabemos que existem vários clubes de automóveis, apaixonados por automóveis, até de modelos em específico, clubes de apenas modelos em específico. O ACP, na parte dos clássicos, tem diversos eventos. e que reúnem os mais diversos modelos. Passei dos alemães, onde temos carros apenas alemães.
Quais são os modelos em Portugal mais comuns de vermos a circular e que passem mais pelo ACP Clássicos? Quais são os modelos mais importantes que dominem mais os clássicos em Portugal?
[00:10:09] Speaker B: Eu diria, pela estatística dos carros que certificamos, há duas marcas que se distinguem das demais, que é a Mercedes e a Volkswagen. Duas marcas alemãs. Aliás, era natural que isso aconteça porque as marcas alemãs continuam no ativo, não é? Coisa que já não acontece com uma esmagadora maioria das marcas inglesas, portanto... Regressam.
[00:10:34] Speaker A: Agora... Peço desculpa, Luís. Regressam agora como eletrificadas?
Nada tem em...
[00:10:39] Speaker B: Há muito pouca ligação até emotiva com aquilo que eram os modelos.
E, de facto, as marcas inglesas que existem são marcas de topo, portanto que nunca foram marcas de grande quantidade. E...
E em termos de marcas temos a Mercedes e temos a Volkswagen.
Modelos. Os modelos desportivos, e aí é mais ou menos transversal a todas as nacionalidades, os modelos desportivos tendem a ter um período de vida, porque são utilizados com outro propósito. Grande parte deles nunca foram automóveis de uso diário.
[00:11:25] Speaker A: Estão mais preservados?
[00:11:26] Speaker B: Estão mais preservados. Aí as marcas inglesas têm uma expressão interessante.
Há muitos MGs, por exemplo. Tem uma taxa de sobrevivência bastante grande.
Porsches... Enfim, em cada marca há, de facto, uns quantos modelos que se distinguem.
[00:11:46] Speaker A: Temos visto uma adesão bastante grande aos eventos do ACP Classics e o clube tem estado a crescer. O que é que leva a esta adesão? Será também esta parte que falávamos há pouco de uma eletrificação e de carros cada vez menos pessoais e apaixonantes que levam gerações mais jovens a procurar o clube? Ou mesmo a quem tem um automóvel clássico a querer estar relacionado e a querer integrar?
[00:12:10] Speaker B: É um pouco de tudo. É um pouco de tudo. Há indiscutiblemente um fator de moda porque é uma coisa que não é... deixou de ser vulgar, não é? Portanto...
há quem tenha, em termos de mobilidade, satisfeito as suas necessidades mais básicas, começam a olhar para uma coisa diferente. Eu acho que aqui, para não enumerar os fatores todos, acho que há aqui um que se distingue e que tem uma grande importância hoje em dia. É que os automóveis evoluíram de tal maneira, quer em termos de qualidade de construção, quer em termos de potência, de velocidades e isso tudo.
Eu até diria que há aqui alguma contradição.
um automóvel de 500 ou 600 cavalos, ou de 400, em muito poucos momentos se consegue tirar partido disso.
E, portanto, se queremos andar dentro daquilo que é a legalidade das regras rodoviárias, ir com um Porsche 600cv até ao Porto é completamente enfadonho, não é? Isto se respeitarmos os 120 ou 130kmh.
Enquanto num clássico, grande parte dos clássicos dentro daquilo que são os limites de velocidade, já dá um prazer enorme fazer um passeio na Serra do Poçaco, na Serra de Sintra, naquilo que for, com um clássico. Temos uma perceção de velocidade e de relação com a máquina muito mais próxima daquilo que temos com o automóvel moderno. Quando vamos a conduzir um clássico, temos de estar concentrados naquilo que estamos a fazer. Não há distrações de carplay, nem de telemóveis, nada, porque é preciso... Eu tive essa experiência agora no Raio de Figueira de Foz de Lisboa e conduziram um Austin 7 de 1928. Temos mesmo que ir concentrado, porque há menor distração ele ganha vida própria.
E isto, estamos a falar a 40 ou 50 km de hora, que já é uma velocidade para aquele carro que exige de facto...
[00:14:24] Speaker A: A sensação de velocidade é muito superior.
[00:14:27] Speaker B: Muito, muito. E ainda maior, é curioso, ainda maior quando conduzimos isoladamente numa estrada de uma estrada florestal, uma estrada que não seja uma estrada principal onde não há comparação com outros carros.
Ali não somos ultrapassados.
E é nesse tipo de ambiente que há, de facto, para quem gosta de conduzir. Há quem goste dos clássicos, uma questão meramente estética, e do ponto de vista de condução, até nem acha grande graça. Agora, quem alia essas duas coisas, gostar do mundo dos clássicos e também gostar de conduzir, A condição de um clássico, e isso recomendo a quem não experimentou, é viciante.
[00:15:11] Speaker A: Luís, e falando do Ride Fair da Foz, quais foram os modelos de destaque desta edição?
O Austin é de 1937, correto?
[00:15:20] Speaker B: Não, 1928.
[00:15:21] Speaker A: Ah, 1928.
Tínhamos carros mais antigos em prova?
[00:15:24] Speaker B: Tínhamos alguns, mas não tivemos abaixo da década de 20. De repente não me consigo lembrar muito bem.
[00:15:31] Speaker A: Isto porque contava os desafios que tiveram de enfrentar durante este quilómetro.
[00:15:35] Speaker B: Eu destacaria...
pela quantidade de modelos dessa marca que estiveram presentes, que é o Ford Model A, o modelo A, o Ford A, representava ali uma fatia importante dos carros, porque de facto são uns carros absolutamente fantásticos, quer dizer, há Ford A's em diversas configurações de carreceria, mas são automóveis que resistem a tudo, com uma grande facilidade de manutenção, Foram carros.
[00:16:07] Speaker A: Muito produzidos e córners simples.
[00:16:11] Speaker B: Boas razões, porque de facto eram muito simples, eram muito boas. É preciso... contextualizar esse modelo, estamos a falar na América Profunda, em que era uma qualidade de construção e uma simplicidade de construção que já vinha do 4T. O 4A foi uma evolução do 4C em muitos aspectos, mas que do ponto de vista prático tinha a mesma robustez e era um alvo muito procurado, muito vendido.
e em Portugal também se venderam bastantes. Estou-me a lembrar, porque não é muito vulgar, juntar dois modelos de MG J2.
Tivemos no Raid foram dois J2, que é um dos paradigmas dos desportivos britânicos. É muito interessante pensar que No fim dos anos 20 apareceram esse tipo de modelos e que perduraram sem grandes modificações até os anos 50. Quer dizer, aquela configuração com guarda-lamas... Sim, sim.
A Morgan teve carros assim... De fato, uma série de marcas.
[00:17:24] Speaker A: Que definiram ali o design britânico durante essas épocas. Esse era o estilo de um carro inglês.
[00:17:30] Speaker B: Com particularidades interessantes, porque aquilo, do ponto de vista de condições de proteção climatérica, é o pior que se pode pensar. Aquilo é mesmo para chover lá dentro. Ainda hoje são assim.
[00:17:48] Speaker B: Que utilizamos. Claro. E houve também outros carros. Enfim, posso destacar, sem querer ser injusto para todos os outros, um Cadillac V12, que era de facto um segmento superior nos Estados Unidos.
[00:18:05] Speaker A: Grandes cilindradas que na Europa eram... Sim, grandes cilindradas.
[00:18:09] Speaker B: Motores com enormes binários e muito confortáveis de utilizar.
[00:18:14] Speaker A: E, Luís, quando existe alguma dificuldade e os sócios mais aficionados, ou os sócios que têm aptidões também mecânicas, partilham conhecimento entre eles, sugerem alguma... Sim, sim.
[00:18:26] Speaker B: Aliás, neste tipo de passeios, de provas, se alguém fica na estrada, e depois param para... E normalmente as coisas resolvem-se, porque também é outro dos encantos deste tipo de automóveis.
[00:18:40] Speaker A: Eu fazia esta pergunta por causa da questão cultural de início de conversa que tivemos, de partilha, de conhecimento, de importância histórica. Isso também continua a existir?
[00:18:50] Speaker B: Muito, muito. Aliás, eu noto muito isso, até durante as certificações, quando estamos em presença de alguém que esteve dois, três, cinco, dez anos a restaurar um determinado modelo, Quer dizer, é um conhecimento absolutamente enciclopédio a maior parte das vezes.
[00:19:08] Speaker A: É especializado, mas é o modelo.
[00:19:09] Speaker B: Conhece os detalhes todos e, portanto, nós usamos muito esse conhecimento adquirido para quando temos outro sócio que tem uma dúvida, que nos contacta e com uma dúvida no terminal modelo, pomos os sócios em contacto porque ficam os dois muito felizes porque quem dispendeu esse tempo e esse... e adquiriu esse conhecimento, tem muito orgulho em partilhá-lo. Portanto, é muito, muito útil para quem...
[00:19:45] Speaker A: E quem precisa da informação fica privilegiado porque consegue aceder.
[00:19:49] Speaker B: Claro, claro. E criam-se grandes amizades. Isto, aliás, é outra das partes boas do ponto de vista social, do ponto de vista.
[00:19:59] Speaker B: De relacionamento há grandes amigos que têm de facto que a razão primeira foram os automóveis.
[00:20:06] Speaker A: E ficamos aqui a conhecer então a importância não só histórica dos automóveis como tudo o que os automóveis implicam porque são objetos de verdadeira paixão e que graças a clubes como o ACP que promove eventos destes conseguimos ter aqui encontros, histórias e uma partilha de conhecimento muito grande. Agradeço-vos imenso por esta conversa sobre a cultura dos automóveis e agradeço também a quem nos esteve a ouvir. E para quem tem interesse e é proprietário de um automóvel clássico, se quiser entrar em contacto com o ACP Clássicos, basta entrar no site onde têm lá partes direcionadas próprias para esclarecerem todas as dúvidas e tornarem-se também sócios não só do clube como dos clássicos. Obrigado. Se quiserem ouvir mais podcasts podem passar no site do Automóvel Clube Portugal ou ir ao Spotify ou ao Apple Podcast. Obrigado.