Episode Transcript
[00:00:02] Speaker A: Viajar é para todos é um podcast do Automóvel Clube Portugal que vem mostrar que viajar é mesmo para todos, independentemente das condições e características de cada um. Eu sou a Sofia Martins, sou autora do blog Just Go By Sofia, Sou paraplégica, adoro viajar, já visitei mais de 40 países e concretizei o sonho de dar uma volta ao mundo. Aqui trago convidados com outras visões e outras necessidades, esperando contribuir para que outras pessoas descompliquem na hora de escolher o destino e partir. Este podcast tem o patrocínio da Max Finance.
Bem-vindos ao Viajar é para Todos, um podcast do Automóvel Clube Portugal.
A minha convidada de hoje é a Patrícia Carvalho. Olá Patrícia, bem-vinda. Obrigada por teres aceitado fazer esta viagem comigo.
Vamos fazer o check-in?
[00:00:57] Speaker B: Bora.
[00:00:57] Speaker A: E para onde é que vamos?
[00:00:58] Speaker B: Para a Tailândia.
[00:01:00] Speaker A: Ótimo, belo destino, onde eu nunca fui.
A Patrícia é cientista de formação e viajante de profissão, é autora do blog Girl From Nowhere, escreveu dois livros sobre as suas aventuras, acabou de regressar de uma grande viagem pela Ásia, desta vez a viajar grávida, e é líder de viagens.
Agora, não sei como, mas juntamos a tudo isto uma fobia de andar de avião.
Patrícia, antes de mais queria saber um bocadinho como é que começou esta paixão pelas viagens e como é que chegaste a líder de viagens?
[00:01:38] Speaker B: Olha, como é que começou? Eu não sei bem porque apesar de eu viajar com os meus pais quando era miúda nunca fizemos assim grandes viagens nem para destinos muito exóticos, nem propriamente viagens de mochila às costas, nem nada do género. Para mim eu sempre viajei às fériasinhas do Algarve e três ou quatro dias aqui e ali e sempre foi muito por aí. Os meus pais não são muito pessoas de se aventurar.
Aquilo que despertou em mim o interesse para viajar foi um livro do Gonçalo Cadílica que eu li quando tinha 17 anos.
E foi a primeira vez que eu percebi que era possível viajar sem ser ir cinco dias à França, digamos assim. Que era possível pegar uma mochila e ir, e havia mais mundo, e a China, a Ásia, aquilo que se vê na televisão, era possível ir, e não era uma coisa para qualquer iluminado.
E depois também porque comecei a ler mais sobre isso, a encontrar na altura os primeiros blogs em Portugal que estavam ainda um bocadinho a nascer. Sim. Blogs de viagem, a conhecer pessoas que iam, que faziam e portanto depois acabou por ir por aí adiante até eu própria fazer a minha primeira...
[00:02:52] Speaker A: A tua primeira viagem sozinha.
[00:02:54] Speaker B: Sozinha.
Que depois acabou por me levar à minha maior viagem que fiz até agora Foi no final dos estudos, portanto no final do mestrado eu tirei um ano para viajar.
E depois por aí adiante, hora com amigos, depois com o meu namorado mais tarde, fui sempre viajando. Nunca com o intuito de ser o meu trabalho.
Portanto sempre foi um hobby, sempre foi uma coisa que eu fiz de uma forma um bocadinho dentro daquilo que era possível. Tirando o ano que eu tirei depois do mestrado em que aí sim eu viajei muito.
O resto foram sempre viagens muito faseadas.
Mas depois pronto comecei a trabalhar, entrei no mercado de trabalho, estudei bioquímica, fiz investigação, depois mais tarde passei para comunicação de ciência e pronto percebi que não era assim tão feliz a fazer aquilo que queria.
[00:03:45] Speaker A: Eras mais feliz a viajar.
[00:03:47] Speaker B: Era mais feliz a viajar.
Mas também é muito difícil passar a vida só a viajar e conseguir, pronto, ter uma... Fazer isso por profissão, não é? Fazer isso por profissão, exatamente. Não há provavelmente uma fórmula, não há um curso superior que se tira e dá pelo menos uma garantia de que se consiga.
Então andei ali um bocadinho à deriva, mas acho que as coisas foram aparecendo de uma forma muito natural, as oportunidades foram surgindo.
[00:04:13] Speaker A: Sim.
[00:04:13] Speaker B: E eu até acho que fui bastante resistente à mudança, acho que devia ter mudado há mais tempo. Sim. E pronto, houve uma altura em que eu pensei bem, é agora ou nunca, porque depois a vida vai andar para a frente, as responsabilidades vão aumentar e vai se tornar cada vez mais dificilar esse passo.
[00:04:29] Speaker A: E agora, não é?
[00:04:30] Speaker B: Exatamente, então agora?
[00:04:32] Speaker A: Agora principalmente. Olha, mas diz-me uma coisa, a primeira viagem que fizeste sozinha não foi assim uma maravilha? Ou foi logo aquilo que querias?
[00:04:45] Speaker B: Não, não de todo. A primeira viagem sozinha eu tinha 21 anos na altura e fui para a Tailândia e eu costumo dizer que eu nunca tinha viajado sozinha Nunca tinha saído da Europa e nunca tinha estado fora de casa mais de uma semana.
E lá em cima assim para uma viagem de três.
[00:05:00] Speaker A: Isso é que foi uma grande aventura, não é?
[00:05:01] Speaker B: Exatamente. Ou seja, eu tive um choque cultural... Pensaste em desistir? Claro. Eu cheguei lá e três dias depois estive quase a isto de comprar um voo para vir embora porque estava numa cidade com 10 milhões de habitantes, um calor altíssimo, uma umidade enorme, uns cheiros intensos.
[00:05:18] Speaker A: E começar logo na Ásia, que assim há ali uma grande diferença.
[00:05:23] Speaker B: Não há pontos de contacto. Eu falava mal inglês ou praticamente nem falava. Aquilo foi muito difícil, a adaptação foi...
E eu acho que isso é uma coisa muito engraçada porque nós sabemos que é diferente mas a experiência sensorial colmata todas as fotografias, vídeos que uma pessoa possa ver. Estar lá é muito diferente de estar cá no sofá de casa a ver as fotos lá.
[00:05:46] Speaker A: E daquilo que nos contam, não é?
[00:05:48] Speaker B: E daquilo que nos contam.
[00:05:49] Speaker A: Cada experiência é uma experiência.
[00:05:50] Speaker B: E então tive um choque cultural muito grande, pensei seriamente em desistir. A minha mãe convenceu-me.
fortemente a regressar.
Sim. Mas eu pensei não, opá, vou aguentar mais dois, três dias e depois pronto, entrei na Wanda e fui até ao fim.
Não foi a melhor viagem que eu fiz porque estava muito fechada, estava com muito medo.
[00:06:12] Speaker A: Sim.
[00:06:12] Speaker B: Medo de falar para as pessoas, medo de me quererem fazer mal, medo de tudo e mais alguma coisa.
E depois só numa segunda fase é que então usufrui da viagem de forma diferente.
[00:06:22] Speaker A: Numa segunda fase? Na mesma viagem?
[00:06:24] Speaker B: Não, na outra viagem. Na viagem seguinte, sim.
[00:06:26] Speaker A: A viagem que tiraste um gap year?
[00:06:28] Speaker B: Sim, exatamente. Aí sim.
[00:06:29] Speaker A: E essa foi para onde?
[00:06:31] Speaker B: Essa foi também à Ásia. Começou na Tailândia.
E depois fiz aquela região todo o sexto asiático. Lá, o Escambojo, o Vietnam.
Fui até ao Mianmar, Nepal. E depois desci até a Malásia.
[00:06:44] Speaker A: E aí já vieste rendida?
[00:06:47] Speaker B: Aí já, aí já vim. Embora tenha vindo essa viagem com a certeza de que ia seguir os meus estudos e que aquilo tinha sido um ano que tinha sido fantástico. Para mim esse ano só tinha uma regra que é não há ciência.
Porque eu tinha estudado bioquímica. e tinha estudado muito. Eu era uma menina super focada nos estudos, super organizada, queria ter boas notas. Então, nesse ano pensei, porra, tive 5 anos a estudar Ciência e a matar-me para ser boa nisto. Neste ano eu vou fazer tudo o que não tem a ver. Portanto, vou fazer o voluntariado que sempre quis fazer, vou escrever, que era uma coisa que eu adorava fazer, mas por conta dos estudos e da exigência foi um hábito que eu perdi. Vou ler os livros todos que tenho na minizinha de cabeceira para ler. Este ano vai ser meu.
E foi.
Eu costumo dizer que foi o melhor ano da minha vida.
Não é que não tivesse tido anos melhores e à medida que a idade avança claro que há fases diferentes na vida mas foi o ano em que eu fui mais livre e tenho a certeza que nunca mais vou ser dificilmente vou voltar a ser tão livre como naquela altura. Lá está, não quer dizer que não vai ter coisas boas no futuro mas foi muito bom ter-me permitido durante um ano abrir horizontes. Mas voltei ainda muito focada com... E.
[00:07:54] Speaker A: Quando é que entrou então aí o ser líder de viagens?
[00:07:59] Speaker B: Entrou mais ou menos dois anos, vai fazer agora dois anos, quando a empresa onde eu trabalhava fechou.
Então, aí eu pensei bem.
[00:08:06] Speaker A: São aquelas oportunidades que surgem de desmestrar.
[00:08:08] Speaker B: Exato. Eu já me tinha despedido duas vezes, portanto no final do mestrado eu não tinha querido permanecer lá e depois quando estava a fazer investigação também me tinha despedido para fazer comunicação de ciência.
E pensei, eu tenho 28 anos, já me despedi duas vezes, não vou despedir uma terceira, senão os meus pais matam-me.
Por acaso a empresa fechou e eu pensei, olha, se isto não é destino, não sei o que é, mas vou com tudo. E a partir daí foi ser para abrir e parece que foi ontem.
[00:08:37] Speaker A: E quantas viagens fazes?
[00:08:39] Speaker B: Depende sempre de ano para ano, da minha disponibilidade também, porque este ano tive a surpresa de engravidar e portanto tive que agilizar um bocadinho o calendário, mas normalmente entre duas a quatro.
[00:08:52] Speaker A: Com grupos.
[00:08:52] Speaker B: Com grupos, sim.
[00:08:53] Speaker A: E depois ainda viajas sozinha, não é?
[00:08:54] Speaker B: E depois ainda faço as minhas viagens, sim.
[00:08:56] Speaker A: Claro. E agora a pergunta, como é que uma líder de viagens e que faz tantas viagens tem fobia de andar de avião?
[00:09:06] Speaker B: Como é que... Como é que faz esta gestão, não é?
[00:09:09] Speaker A: Como é que faz esta gestão? E como é que apareceu esta fobia? Sempre existiu?
Ou foi por alguma razão?
[00:09:14] Speaker B: Olha, não, esta fobia não existiu sempre. Ou seja, houve um momento em que eu passei a ter medo de andar de avião.
Isso foi um episódio de um voo mais ou menos difícil que eu tive em 2020... 2021.
[00:09:26] Speaker A: Não.
[00:09:26] Speaker B: 2020 e depois fiquei sem voar até 2022 ou 2021. Por causa da pandemia. Sim.
E então eu acho que o fator pandemia não foi bom porque eu tive um voo um bocado turbulento e depois fiquei muito tempo sem voar. E só quando andei de avião é que percebi que tinha desenvolvido um trauma. Talvez se eu tivesse feito viagens recorrentes aquilo tivesse amenizado.
Isto para dizer que eu tenho um passado em que eu não tinha medo de andar de avião. E isso é bom, digamos assim, porque...
Está normalíssimo. Sim, normalíssimo. Eu tenho memórias disso. Portanto, isso ajuda-me a superar um bocadinho aquilo que passo hoje em dia. Porque eu sei exatamente o momento em que aquilo aconteceu e o que é que eu senti. E cada vez que eu hoje em dia tenho medo e pânico e até despleto um ataque de pânico, eu volto para trás para aquele dia, para aquele momento.
Mas do ponto de vista de tratamento e superação é bom sabermos onde é que começou.
[00:10:33] Speaker A: Sim.
[00:10:34] Speaker B: E pronto, e a partir daí depois, quando fiz o primeiro voo depois desse, é que eu percebi que tinha criado um trauma.
E fui numa viagem à Turquia, que estava aí sozinha, e estava super irrequieta no voo. Comecei a ter aqueles comportamentos de estar constantemente a ver que horas eram, contar os minutos. não conseguia estar mais do que 10 minutos a ver um filme, nem 5 sinceramente.
Constantemente olhar para a cara das mulheres em bordo, para saber como é que elas estavam. Aquilo pi que às vezes é simplesmente elas estarem a ligar a dizer olha, falta água aqui no meu carrinho ou o que seja, para mim já era um sinal de...
E depois por fim o barulho, o som de ligar os cintos de segurança por causa da turbulência, isso para mim é...
É quase... não ligo a falar.
[00:11:18] Speaker A: Foi numa turbulência.
[00:11:19] Speaker B: Foi numa turbulência que eu tive, ou seja, apesar da maior parte dos acidentes de aviação acontecerem ou na descolagem ou na aterragem, eu tenho medo é lá em cima. Então quando está a aterrar, que faz imenso barulho, tem aquelas coisas todas, eu estou na boa.
[00:11:32] Speaker A: Já estás quase ali, não é?
[00:11:33] Speaker B: Já estou quase a chegar, não me interessa nada, mas quando está lá em cima, se tiver um bocadinho de turbulência, é sempre algo que mexe comigo.
[00:11:41] Speaker A: Mas passaste sozinha? Procuraste ajuda?
[00:11:45] Speaker B: Não, eu procurei ajuda mais ou menos há...
Sim, há mais de um ano e meio, quase dois anos, eu procurei terapia para fazer, pronto, no fundo é ultrapassar uma fobia, não é?
[00:11:58] Speaker A: Sim.
[00:11:58] Speaker B: Psicoterapia. Fiz algumas sessões que me ajudaram imenso, em que basicamente foi racionalizar um bocadinho aquilo que aconteceu e perceber que quantos voos já aconteceram depois daquilo, em que facto a luz da turbulência ligou e de facto o avião não caiu.
[00:12:13] Speaker A: Não, não aconteceu nada.
[00:12:14] Speaker B: Portanto, se em princípio não caiu, se em princípio todas as pessoas que estão à tua volta estão tranquilas, Isso quer dizer alguma coisa e eu entendi isso e isso fez muito bem.
E essa psicoterapia coincidiu na altura em que eu comecei a ser lidera de viagem.
E nesta profissão eu tenho alguns voos que faço com os viajantes que vão comigo.
[00:12:35] Speaker A: Convém que vás tranquila, não é?
[00:12:37] Speaker B: A última coisa que eu quero é que a malta comece a estar a estressar porque eu estou a estressar também.
Então apesar de eu fazer sempre o aviso aos meus viajantes que olhem eu tenho este trauma, por favor, se eu sentir mal, não interpretem que está alguma coisa de errado a acontecer e normalmente as pessoas percebem perfeitamente e até me ajudam e até têm sido bastante simpáticas comigo nesse aspecto. Eu acho que isso ajudou, porque tinha o peso da responsabilidade de isto agora é trabalho, vais ter que viajar mais, portanto é bom que isto melhore. E melhorou.
Mas eu acho que converteu-se num medo um bocadinho diferente que é e eu tenho noção que o avião não vai cair, eu já tenho noção que a viagem vai ficar bem, que eu vou chegar ao meu destino, eu tenho medo da minha reação, porque o meu cérebro já está, digamos que pronto, mas o meu corpo ainda responde aos acontecimentos, ou seja, o meu corpo, as minhas mãos ainda começam a suar, o meu olhar desvia-se para o sinal de turbulência, por muito que a minha cabeça já esteja mais ou menos treinada digamos assim, do ponto de vista racional, a não reconhecer aquilo como um perigo, o meu corpo não. E eu agora tenho medo que o meu corpo expolete reação.
[00:13:53] Speaker A: Sim.
[00:13:53] Speaker B: Ou seja, tenho medo de começar a chorar, embora eu saiba que não...
E acontece? Desde que fiquei grávida, sim.
[00:14:00] Speaker A: Desde que fiquei grávida?
[00:14:02] Speaker B: Pois, não sei se pode ser das hormonas, dei um passinho atrás, confesso que... Sim, não sabes. Não sei, e fiquei um bocadinho triste quando me senti mal num voo da última vez, que foi agora nesta viagem grávida que fiz, foi a primeira vez que...
Já mais de um ano e meio que não me sentia mal e voltei a sentir.
Fiquei um bocadinho desiludida porque pensei que pronto, estava quase ouvida ou estávamos no caminho para... Era passinha, passinha e agora parece que andámos 10 passos para trás.
[00:14:31] Speaker A: E piora se fores acompanhada ou é igual?
[00:14:34] Speaker B: Piora se fores acompanhada.
[00:14:35] Speaker A: Piora?
[00:14:36] Speaker B: Piora porque eu sei que tenho um ombro para chorar. Se eu estiver sozinha, eu sei que estou por mim a quantas vezes.
[00:14:41] Speaker A: Aguentas também.
[00:14:42] Speaker B: Portanto, eu não salto a tampa com tanta facilidade porque se saltar não está ali ninguém.
Se estiver, no caso, maioritariamente com a minha namorada, então eu começo a chorar porque está ali alguém que vai estar ali a passar a mão na cabeça. Exato.
[00:14:58] Speaker A: Alguma vez pensaste em desistir por causa dessa fobia?
[00:15:02] Speaker B: Não. E acho que isso foi também algo que me ajudou, além da psicoterapia, foi a exposição ao medo. Ou seja, eu nunca deixei de viajar, fosse para onde fosse, fosse em voos longos de 10, 12, 13 horas, eu nunca deixei de ir. Então, acho que o facto também de estar-me constantemente a expor, por repetição, também ajuda.
[00:15:22] Speaker A: Por exemplo, eu, para mim, fazia grandes viagens de avião É desconfortável, não é por medo, é porque é muito desconfortável. Portanto, eu parto normalmente, não faço uma viagem mais do que 8 horas, mesmo que seja mais. Eu prefiro parar em qualquer sítio e voltar a apanhar outro avião.
Isso para ti faz algum sentido ou não? Ou é-te completamente igual?
[00:15:47] Speaker B: É-me completamente igual, sim.
eu quero é chegar mais rápido no global. Ou seja, com paragens ou sem paragens, o que eu quero é diminuir aquela questão. Sabes quando chegas ao aeroporto e pensas, bem agora só tenho casa daqui a 30 horas, ou 40, ou o que seja, eu quero é diminuir isso.
[00:16:04] Speaker A: Sim, sim, sim.
[00:16:05] Speaker B: Portanto, se isso implicar fazer um voo de 14 horas em vez de vários voos de 8, com escalas de sei lá, 4 horas, prefiro fazer isso?
[00:16:12] Speaker A: Claro, só de seguida.
[00:16:14] Speaker B: Exatamente, porque eu meto o chip que, ok, agora vou se edificar horas a sofrer, que seja, rápido.
[00:16:20] Speaker A: Patrícia, a tua última viagem foi há muito pouco tempo e grávida.
[00:16:29] Speaker B: Sim.
[00:16:30] Speaker A: Para a Tailândia?
[00:16:33] Speaker B: Sim.
[00:16:33] Speaker A: Não só?
[00:16:34] Speaker B: Tailândia, Malásia e Indonésia.
[00:16:36] Speaker A: E Indonésia.
E como é que se faz uma viagem para um destino desses grávida?
Tiveste algum receio? Correu tudo bem? Como é que é?
[00:16:51] Speaker B: Se calhar isto não é a resposta que as pessoas mais esperam, mas não é muito diferente, a verdade é essa, porque claro que depende muito do estágio da gravidez, eu comecei a viagem com 4 meses e acabei com 7, com 7 é diferente, mas com 4 meses quando comecei não é assim tão diferente quanto isso, tirando o facto de alguns cuidados com alimentação, se calhar uns cuidados líquidos que eu não tinha antes, estar mais atenta ao meu corpo e a perceber se estou bem, se estou cansada, se não estou. Mas normalmente o segundo trimestre é uma fase de muita energia, onde os enjoios já desapareceram e, portanto, eu tiro a imenso partida desse trimestre ao máximo. E depois os esforços físicos, portanto, eu não andei de mochila às costas, levei mal a ralinha, mas durante a viagem durou três meses e eu costumo dizer que durante os primeiros dois meses eu fiz praticamente tudo igual.
[00:17:47] Speaker A: Porque ainda por cima andaste sozinha, não é?
[00:17:49] Speaker B: Sim, andei sozinha, ou seja, não tinha...
[00:17:51] Speaker A: Mas tiveste viagem de... com grupo, não é?
[00:17:53] Speaker B: Tive uma viagem de grupo, sim. Tive a sorte de ter quatro médicas nessa viagem. Ah! Porque tinha um acompanhamento.
[00:17:58] Speaker A: Estavas acompanhada.
[00:17:59] Speaker B: 24 ou 24 horas.
[00:17:59] Speaker A: Muito bem acompanhada.
[00:18:01] Speaker B: Exato.
Mas a viagem em si não é tirando a mala que é mais difícil de carregar.
[00:18:08] Speaker A: Mas foste fazendo exames e fizeste ticografias.
[00:18:12] Speaker B: Em todo o lado.
[00:18:13] Speaker A: Isso foi fácil? Conseguiste acesso?
[00:18:16] Speaker B: Sim, foi porque, pronto, são países mais ou menos turísticos. onde já tiveram muitos transgêneros e alguns deles grávidos e que já escreveram sobre isso na net. Portanto tu hoje em dia fazes uma pesquisa e encontras. Em última instância também já cheguei às vezes a bater à porta mesmo de hospitais ou assim que via e perguntava-lhe pode ser uma ecografia? Faz ecografias.
E na maior parte dos sítios fazem e pronto é só chegar, pagar e andar.
Os preços também não são aquilo que são aqui, portanto acaba por... Eu costumo dizer que sou a grávida que mais ecografias fez. Deve ter feito para aí umas 15. Mas depois a dada altura cada vez que prestava na andada de avião tinha que ter uma...
[00:18:52] Speaker A: Pois, era isso que eu ia perguntar.
[00:18:53] Speaker B: Uma declaração. Tinha que estar constantemente a fazer muito mais do que se tivesse ficado aqui em Portugal. Por isso de certa forma até estava um bocado descansada porque, opá, foram tantos médicos diferentes a fazer micrografias que se alguma coisa tivesse mal alguém teria reparado.
[00:19:08] Speaker A: E depois pronto, no fim... Fizeste quantas viagens de avião nesta última viagem?
[00:19:11] Speaker B: Ai, fiz à vontade umas 5 ou 6.
[00:19:14] Speaker A: Isso é muito. E não agravou o facto de estar grávida? Não teve implicação nenhuma contra?
[00:19:23] Speaker B: Acho que eu saiba, para já não.
A gravidez escolhidamente.
Para mim psicologicamente foi maravilhoso porque acho que a gravidez é uma fase muito dura para a mulher do ponto de vista de tudo. É uma fase nova que nos massaca imenso. É um mundo inteiro que parece que nos vai engolir.
E ter o privilégio de sair desta bolha de maternidade e poder passar esta fase da minha vida a fazer uma coisa que eu amo, foi um privilégio que eu acho que, embora tivesse noção da surpresa que era, eu acho que só daqui a uns anos é que eu penso a fogo, a sorte que eu tive. Eu já penso, mas acho que vou sentir isso ainda mais aqui para a frente com um carinho super especial.
Porque, pronto, nem toda a gente pode fazer e eu consegui fazê-lo.
E deixou-me muito, muito, muito tranquila com esta gravidez.
[00:20:14] Speaker A: E achas que vai mudar alguma coisa quando nascer o bebê?
[00:20:18] Speaker B: Claro que vai, sim, claro que vai.
[00:20:20] Speaker A: Mas vão continuar as viagens?
[00:20:22] Speaker B: Sim, eu acho que vão continuar as viagens.
Pelo menos com ele e as minhas viagens pessoais, claro que vão continuar porque essa é a minha vida e a do meu namorado, nós viajamos muito.
E vamos continuar a viajar também com este bebê.
E em termos do meu trabalho, eu espero que também continue a acontecer da forma que tenha acontecido.
Vai ser mais difícil, mas isso foi o que me atingiu há bocado.
A viagem que eu fiz com 24 anos eu nunca mais vou fazer, porque ao longo dos anos que passam as responsabilidades aumentam e fica sempre mais difícil ir embora. Se fosse porque comecei a viver sozinha e passei a ter a minha casa, depois passei a ter o meu cão, depois passei a ter o meu namorado. e agora tenho a casa, o cão, o namorado e o filho a deixar. Portanto, isto é sempre a acumular e tenho a certeza que me vai custar muito mais mas também tenho a noção que tenho um apoio muito grande tanto da parte dele como da parte da minha família.
Uma rede de apoio que está lá para o que for preciso.
[00:21:18] Speaker A: Claro.
[00:21:18] Speaker B: E acho que pronto, tudo se faz. Agora estou numa fase muito mais tranquila com isso e vamos indo e vamos vindo.
[00:21:25] Speaker A: As tuas viagens são mais para a Ásia?
[00:21:27] Speaker B: Sim, Sudeste Asiático.
Eu faço o Triângulo Dourado, o Laos, Camboja e Vietnam e tenho feito também Bali.
[00:21:36] Speaker A: E é por tua escolha?
[00:21:38] Speaker B: Sim, por minha escolha. Algumas sim, outras porque vão surgindo oportunidades e também tenho alguns destinos que quero fazer novos, mas estamos tudo assim. Neste momento é algo em que fica para depois quando eu regressar e perceber o que é que se pode fazer.
[00:21:54] Speaker A: Patrícia, estamos a chegar à Tailândia.
Porquê a Tailândia? Creio que já se percebeu aí um bocadinho.
[00:22:00] Speaker B: Sim, porque no fundo é o país onde eu regresso sempre.
Foi o primeiro país que me recebeu quando estava a viajar sozinha.
Foi o país que me recebeu quando eu comecei o meu périplo de um ano a viajar.
E, por força do destino ou não, foi onde eu fui parar agora também nesta gravidez.
Nesta última viagem, eu fiz a viagem, a viagem durou 3 meses, eu tive 2 meses sozinha e depois no último mês me enamoraram junto a mim.
Ele sempre, nunca tinha ido à Tailândia, ele sempre quis ir à Tailândia.
Eu sempre disse, opá já fui à Tailândia 4 ou 5 vezes.
Quando tiver 60 anos eu levo-te para a Tailândia. Agora não me venhas chatear para ir outra vez, pela sexta vez à Tailândia.
Mas a verdade é que eu estava ali na Indonésia, que era mesmo ao lado. Tinha feito uma viagem em Bali com um grupo, portanto a Tailândia estava ali ao lado.
Ele tinha 5 semanas de férias e acabámos por ir para lá sem pensar muito. Foi um destino que surgiu muito naturalmente.
E a brincar a brincar é o destino que marca a minha vida de viajante e que esteve presente nos vários momentos da minha vida e nas várias fases. Portanto, eu conheci a Tailândia como uma menina que nem sabia falar inglês e nunca tinha viajado.
Conheci a Tailândia com já mais alguma maturidade, mas ainda muito ingênua.
E agora conheci a Tailândia a três.
[00:23:23] Speaker A: Se calhar vai ser o primeiro destino.
[00:23:25] Speaker B: Do... E se calhar vai ser o primeiro destino do Francisco.
[00:23:27] Speaker A: Do Francisco.
Patrícia, sabemos que cada caso é um caso, mas que conselho dás a alguém que tenha medo de andar de avião e que não viaje por causa disso?
[00:23:42] Speaker B: A procurar ajuda, acima de tudo, porque estas fobias são reais e eu própria já tive várias na minha vida, algumas ultrapassei, outras não.
Aliás, quem acompanha o meu trabalho sabe que eu tinha um medo que me pelava de cães.
E acabei por substituir um medo com o outro.
E agora tenho um cão.
[00:24:01] Speaker A: E agora tens um cão.
[00:24:02] Speaker B: Portanto, tudo se ultrapassa e as chuvas também se ultrapassam. É preciso é nós também querermos e sermos um bocadinho proativos nisso. Portanto, eu acho que a psicoterapia está lá para nos ajudar nisto e é a primeira coisa que recomendo. E a segunda é não desistir.
E quando eu digo não desistir não é não desistir de viajar. Porque eu sei que eu consigo entrar num avião mas há pessoas que não conseguem.
mas é não desistir de o querer curar. Se calhar alguém pode não conseguir entrar num avião agora e não tem que o fazer mas pelo menos não desista de curar o seu medo e o seu trauma porque o mundo é um lugar incrível, viajar é das melhores coisas que podemos fazer enquanto pessoas e se deixarmos que isto nos limite Ficámos muito, muito, muito condicionados.
[00:24:47] Speaker A: Claro, mas preferes uma viagem de carro ou de combaio?
[00:24:51] Speaker B: Não, porque prefiro sempre viajar para longe.
[00:24:53] Speaker A: Preferes viajar para longe. Tens sempre que ter o avião nas tuas viagens.
[00:24:58] Speaker B: Eu também consigo viajar cá por perto e consigo... e o meu namorado há anos que me chateia para comprar uma caravana e eu digo-lhe sempre não vamos comprar porque no dia em que comprarmos uma caravana só vamos andar aqui à volta e eu não quero andar aqui à volta. Andámos aqui à volta quando tivermos 60 anos e não podemos ir a mais lado nenhum. Portanto até lá vamos para a China, para o Japão, pronto.
Eu gosto muito de viajar para locais onde a diferença é muito grande. Quanto mais diferente, melhor, digamos assim.
E esses destinos acabam por estar mais longe. O avião acaba por ser quase obrigatório.
[00:25:28] Speaker A: E qual é o destino preferido? Será mesmo a Tailândia?
[00:25:32] Speaker B: Acho que sim, acho que é uma das minhas preferidas, embora não sejam destinos que eu queira sempre voltar. Eu tenho muito mundo para ver.
[00:25:38] Speaker A: Claro.
[00:25:39] Speaker B: E tenho muitos países que gostava de visitar e pá, a minha lista é enorme, não é? Como de qualquer viajante.
[00:25:45] Speaker A: Claro.
[00:25:46] Speaker B: Quanto mais mundo se vê, mais mundo se quer ver.
Mas sim, é aquele destino que fica sempre no meu coração.
[00:25:52] Speaker A: Olha, o teu cão também tem uma história com a viagem, não é?
[00:25:55] Speaker B: Também tem, encontrei-o numa viagem. Bem perto, foi aquele caminho de Santiago.
[00:25:58] Speaker A: Nos carrinhos de Santiago.
[00:25:59] Speaker B: Sim, estava a fazer o caminho E estava cheia de cães, porque o caminho de Santiago, quem já fez sabe que ele passa por muitas aldeias.
E aldeias têm cães todos.
E então eu encontrei o Santiago no primeiro dia de caminho e ele seguiu-me até a Espanha. Três dias.
E pronto, e depois, quer dizer, o cão protegeu-me dos outros cães, não é?
[00:26:22] Speaker A: Sim.
[00:26:22] Speaker B: Eu tinha medo dele, mas ao menos ele afastava os outros. Portanto aquilo acabou-se porque criámos ali uma relação e depois eu acabei por ficar com ele e ainda hoje vivo connosco. É o Santiago, por causa do caminho Santiago.
[00:26:33] Speaker A: É o Santiago.
[00:26:34] Speaker B: E foi uma maneira de ultrapassar o medo e hoje em dia se há coisa que eu não tenho é medo de cães. Adoro cães. É.
[00:26:39] Speaker A: É.
Portanto a utrofobia que ultrapassaste.
[00:26:44] Speaker B: E depois o avião veio depois desta, por isso eu acho que reciclo medos. Ou seja, quando acabo de curar um, estava toda corrente. Quando curar o avião, vem outro. Espero bem que não, mas...
[00:26:54] Speaker A: Não, vais ficando com a do avião, afinal, já consegues lidar bem com ele, não é?
[00:26:58] Speaker B: Sim.
[00:26:59] Speaker A: Talvez tenha agora agravado um bocadinho, mas...
[00:27:03] Speaker B: Pode ser que volte para trás.
[00:27:04] Speaker A: Pode ser que tenha sido com a gravidez, não é?
[00:27:06] Speaker B: Sim.
[00:27:08] Speaker A: Ok, Patrícia, muito obrigada, espero muito desta viagem.
Nos próximos episódios vamos abordar outras questões e outras condições e mostrar que viajar é para todos.
Podem assistir ao podcast nas plataformas habituais Spotify, Soundcloud, Apple Podcast e nas redes sociais do Automóvel Clube Portugal. Até à próxima.