"ACP Clássicos": clássicos modificados, moda ou necessidade?

Episode 99 October 16, 2025 00:17:25
"ACP Clássicos": clássicos modificados, moda ou necessidade?
ACP - Automóvel Club de Portugal
"ACP Clássicos": clássicos modificados, moda ou necessidade?

Oct 16 2025 | 00:17:25

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Show Notes

No primeiro episódio da série de "Podcast ACP Clássicos" dedicada aos automóveis clássicos Luís Cunha, diretor do ACP Clássicos fala sobre um tema que tem vindo a gerar debate entre entusiastas e colecionadores.

 

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Episode Transcript

[00:00:08] Speaker A: Sejam muito bem-vindos a mais um podcast do Automóvel Clube Portugal. Eu sou o Francisco Costa Santos e hoje vamos falar com o Luís Cunha, responsável do ACP Clássicos, sobre um tema bastante polémico. Os restomods e os restofits. Luís, muito obrigado por estar aqui hoje. Este é um tema bastante polémico porque trata-se aqui de uma alteração das características dos automóveis ou até de uma construção totalmente nova. No que é que se define um restomod? [00:00:37] Speaker B: Viva. É um gosto estar aqui. Não é assim tão polémico porque a definição internacional daquilo que são veículos históricos é clara. E, portanto, tudo aquilo que vai aparecendo com base nos veículos históricos, há uma série de tendências hoje em dia, mas que no fundo, em boa verdade, não se enquadram, são alterações que não são elegíveis para aquilo que é um veículo histórico. E, portanto, da nossa parte não há fundamentalismo, portanto isto não é uma coisa imutável, mas há um conjunto de alterações que tiram de fora do grupo, do veículo histórico, muitas dessas transformações. [00:01:35] Speaker A: Ou seja, quando falamos de modelos como os Singer ou os Chimera com o 037, que é uma réplica, não estamos a falar então de automóveis clássicos de forma nenhuma. [00:01:46] Speaker B: É. São produtos atuais. Muitos deles, de facto, no caso os Singer, com base em modelos históricos, o 964, têm mais de 30 anos, portanto a base daquilo que são os Singer hoje em dia são, de facto, automóveis históricos, mas pelo grau de personalização, pelo grau de transformação que esses carros são produzidos, exclui-os daquilo que são o grupo dos automóveis históricos. [00:02:17] Speaker A: Esta é uma tendência que tem tido alguma popularidade, por exemplo, em países como no Reino Unido, mas que já em Portugal se chega a conhecer agora marcas que estão a pegar em carros e a transformá-los totalmente. Nota-se esta procura ou ainda é algo muito pouco conhecido ou pouco procurado? [00:02:38] Speaker B: Sim, ainda não tem expressão, até porque são tipos de automóveis que são bastante... O custo final de uma transformação dessas é bastante caro, portanto, ainda não atingiu números que se acham significativamente em Portugal. Mas, em todo o caso, em Portugal acresce-se aqui outra dificuldade, que é depois a legalização desse tipo de transformações. [00:03:07] Speaker A: É um processo complicado. [00:03:09] Speaker B: É um processo complicado. O Reino Unido é um bom exemplo porque desde sempre, no pós-guerra, houve grande... e até por dificuldades económicas. Houve uma tendência muito grande na produção daquilo que eles chamavam de Special, modelo Special, porque a partir normalmente de carros familiares fechados, muitos deles anteriores à guerra, aproveitavam o chassi e a mecânica para produzir automóveis desportivos, automóveis de corrida. com carrecerias novas. Portanto, a Inglaterra sempre foi muito aberta a esse tipo de transformações, mas ainda assim, há umas que se enquadram no espírito daquilo que é um veículo histórico, outras, pelo seu grau de transformação, não têm hipótese. [00:03:58] Speaker A: E Luís, e é por aí que vamos? Porque para além dos restomodes, falamos também dos restofits, ou seja, instalar peças modernas ou peças que não são da época do carro para o tornar mais conduzível ou para o tornar mais fácil de guiar. No caso, podemos ir desde uma direção assistida ou passar a pôr uma direção elétrica num carro até um ar-condicionado ou... Primeiro, gostava de saber a opinião do Luís se concorda com esse tipo de modificação ou se tem uma visão mais conservadora de que o carro deve estar ou se isso até é um caso específico de cada carro e até que ponto é que um carro deixa de ser original. [00:04:40] Speaker B: É uma questão de facto interessante. Eu pessoalmente estou absolutamente de acordo com esse tipo de transformações, mas é tudo uma questão de bom senso. A linha vermelha, digamos, é é que essas transformações não sejam irreversíveis. Portanto, tudo aquilo que se faça num automóvel histórico preferencialmente que seja reversível. O caso das direções assistidas é um bom exemplo e hoje em dia são bastante populares porque muitas vezes faz a diferença entre o carro sair da garagem porque tem uma utilização confortável ou ficar na garagem porque tem a direção muito pesada pesada e a condição física do seu proprietário não permite desfrutar do carro. Vendo isso nesse prisma de o carro estar 100% original e estar parado na garagem ou ter algumas transformações que melhoram o conforto da sua utilização e que de hoje para amanhã podem ser desmontadas sem pôr em causa a integridade do carro. Acho que a direção assistida é um exemplo, o ar-condicionado é outro exemplo, porque há de facto carros que... que, para serem utilizados no verão, atingem 50 graus centígrados no interior e, portanto... [00:06:12] Speaker A: É uma questão até de segurança, não é tanto... Também se fala muito dos casos da ignição eletrónica, de certos modelos passar de... Mas aí já são questões mais técnicas. [00:06:22] Speaker B: De... Sim, mas ainda assim, um distribuidor eletrónico hoje em dia é uma coisa que desmonta-se um, põe-se o outro, portanto não é... motores de arranque, motores de arranque com mais potência. Há um conjunto de radiadores de alumínio que hoje em dia, de facto, se pensarmos em carros com 50, 60, 80, 100 anos, os carros não não foram pensados para circular no trânsito de hoje em dia. E, obviamente, que não estamos... Hoje, por acaso, vim até a sede do ACP no Austin 7, de 1928, vim do Campo Grande para a Avenida República, para o Marquês de Pombal. É claro que não é longe de ser um carro deste tipo de pararranque. Fica-nos a chamar nomes. [00:07:13] Speaker A: Está pensado para outra época. [00:07:15] Speaker B: Claro, outra época. Passeios em estrada aberta. E, portanto, esses auxiliares do sistema de refrigeração, como ventoinhas elétricas, radadores de alumínio, são coisas que são absolutamente admissíveis e não prejudicam aquilo que é a condição de integridade do automóvel. [00:07:32] Speaker A: Luís, mesmo nesse caso concreto, por exemplo, pegamos nesse Austin 7, existem alterações que mereçam ser Não, o Austin Seven é... [00:07:43] Speaker B: Quer dizer, esta geração de automóveis... [00:07:46] Speaker A: É muito antiga. [00:07:46] Speaker B: É muito antiga. Há poucas alterações que se façam, porque se justifiquem. Quer dizer, vir para o centro de Lisboa numa manhã de quarta-feira foi exceção, não foi regra. Portanto, são carros que dificilmente têm este tipo de utilização. E, portanto, Poucas transformações se fazem nestes tempos. [00:08:08] Speaker A: Portanto, naqueles modelos mais utilizáveis de anos 50, 60, 70, desde que seja feito com bom senso, irreversível, não existe... [00:08:17] Speaker B: Não há. Porque temos que perceber que há aqui uma questão que é a questão geracional, que é determinante neste nosso movimento. E, portanto, não podemos parar no tempo. A técnica dos automóveis evoluiu. As pessoas estão habituadas a um tipo de utilização. E, portanto, naquilo que se possa ir ao encontro do conforto e da facilidade de utilização, isso também faz com que é benéfico para o movimento, porque se a experiência for muito traumática, o carro a aquecer, não há nada mais angustiante que ir a conduzir um carro que de repente está a aquecer e não. [00:09:03] Speaker A: Ter uma ventoinha elétrica para poder ligar. [00:09:04] Speaker B: Exatamente, e muitas pessoas não sabem como reagir numa situação dessas. E, portanto, são pequenas concessões que temos que fazer para que estes automóveis continuem na estrada, que é o lugar deles. Não queremos estes automóveis nos museus, nas garagens. Queremos que, de facto, continuem a ser um museu sob rodas, que é aquilo que vamos ter Vamos ter, proximamente, no Raio de Figueira da Foz, Lisboa, vamos ter... [00:09:30] Speaker A: Carros para a guerra, não é? [00:09:31] Speaker B: Um conjunto fantástico de carros para a guerra que vai ligar Figueira da Foz para Lisboa em mais de 200 km, como aconteceu na prova que deu origem ao Real Automóvel Clube de Portugal em 27 de outubro de 1902. Portanto, queremos que isso continue a acontecer e, para isso, é preciso que os carros estejam fiáveis e utilizáveis. [00:09:55] Speaker A: E também, pelo que o Luís disse, tem muito a ver também com o propósito do carro. Se for um carro que se queira utilizar regularmente, faz todo o sentido, então, investir nessas modificações. Luís, uma das modificações que temos visto, não em Portugal, mas na Europa e, sobretudo, nos Estados Unidos da América, é a eletrificação de clássicos. O que é que o Luís acha sobre este tema? [00:10:20] Speaker B: Não tenho nada contra. As pessoas são, obviamente, livres de decidirem aquilo que querem para os seus clássicos. Percebo que há pessoas que o gosto pelos clássicos é um gosto meramente estético. Portanto, na perspectiva deles, ali é o melhor dos mundos, que é uma estética, um design intemporal, uma tecnologia mais moderna. Agora, é preciso que quem faz isso tenha noção que vai iniciar ali um período da vida do seu clássico em que essa condição do veículo histórico fica interrompida. E por isso é que é importante, Jaguar fez isso quando o famoso Jaguar é o E-Type onde o Prince Harry saiu no casamento. a Jaguar, a transformação que fez no carro, supostamente fê-lo de forma a que um dia mais tarde, se a mecânica original quiser ser reposta, está lá tudo. Teoricamente não mudaram irreversiblemente o carro. Portanto, nada contra, mas deixam de ser aceitos enquanto, e isso é a posição oficial da FIVA, então abre-se ali um período, na nossa modesta perspectiva que seja curto, mas abre-se um período em que os carros deixam de ser veículos históricos para ser... [00:11:58] Speaker A: Portanto, em todo o mundo é reconhecido, Luís, que se essas alterações forem feitas, o carro deixa de... Porque, por exemplo, temos casos como o Meara e agora existe uma nova marca que os transforma e que os torna 100% elétricos. E lá está, é um pouco o que falamos com os retrofits, de dar uma nova vida obviamente não precisa ser 100% elétrica, mas neste caso, então, é aqui uma opção totalmente menos poluente e o carro continua com as características, ou seja, no caso do 911 continua com o motor na traseira, portanto aquilo em termos de dinâmicas, obviamente que ganha peso, mas consegue ser ali equilibrado. Estas utilizações são feitas para, por exemplo, no caso da conversão dos carros clássicos em elétricos, para se poderem utilizar mais em cidade e lá está, para continuar com este objetivo de os trazer para as ruas. Pode, de alguma forma, ter mais interesse um veículo destes transformado do que um veículo destes original? Em termos de mercado? Ou será, Luís, que por existirem estes carros transformados podem dar mais valor aos clássicos originais? [00:13:14] Speaker B: É difícil ter uma opinião absolutamente formada sobre isso porque depende muito da sensibilidade de cada um. A questão da mecânica original do carro é uma das coisas que mais caracteriza a utilização, a condução de um clássico. tem muito a ver com o ruído que emite, com as sensações que provoca. [00:13:46] Speaker A: Toda a experiência. [00:13:47] Speaker B: Todos nós já experimentamos carros elétricos, são de facto uns meios de transporte eficientes, sem qualquer espécie de dúvidas, mas é uma experiência completamente diferente. Há pouco tocaste na questão das emissões. Quer dizer, é de facto um assunto que, no meio dos veículos históricos, não é longe de ser um problema, porque estes automóveis, de facto, a própria definição daquilo que é um veículo histórico, pressupõe uma utilização esporádica. E, portanto, há dados, a FIVA de 7 em 7 anos faz um um estudo sobre isso. O próprio ACP Clássicos fez este ano, fez um estudo, que divulgaremos em breve, que prova exatamente isso. Muitos destes carros têm uma utilização anual inferior a 500 km, inferior a 1.000, quer dizer, portanto, objetivamente, a questão ambiental não é um problema. E eu acho que o desfrutar de um clássico tem muito a ver com o pacote completo. Mas, repito, percebo que há pessoas que o gosto por um clássico, por um veículo histórico, está na estética, e aí admito que se possa fazer isso, mas não é a nossa praia. [00:15:15] Speaker A: E agora, para terminar, fugindo deste tema da eletrificação, focando no retrofit, será esta uma forma de atrair um público mais jovem para os carros clássicos? [00:15:28] Speaker B: Pode ter esse efeito, embora, admito, quem experimente um carro desses, que do ponto de vista tecnológico está na Está na crista da onda. Depois, experimentando o modelo original, é diferente, mas quem sabe se... Porque ainda esta manhã comentava isso, ao conduzir o Austin 7 em centro de Lisboa e, aliás, vim por Monsanto. Estes carros têm uma particularidade que é interessantíssima, que é a relação da máquina com o piloto. É uma experiência muito intensa, porque requer uma grande atenção. E no Austin 7, essa atenção tanto pode ser a 40 ou 50 km hora. Quer dizer, o grau de concentração que temos que ter a 50 km hora é idêntico, ou se pensarmos num num Porsche atual, é um grau de adrenalina que eu, se calhar, no Porsche, tenho a velocidade completamente fora da lei, não é? E, portanto, o prazer de condução de um carro destes, a velocidade é um fator absolutamente secundário, não é? Portanto, o gozo que eu tenho a 50 kmh neste carro, Terei que andar muito mais de pressa num carro moderno. Portanto, para quem gosta, para quem tem prazer na condução, os clássicos têm esse encanto também. [00:16:58] Speaker A: Luís, muito obrigado. [00:17:00] Speaker B: Com gosto. [00:17:00] Speaker A: Muito obrigado por nos esclarecer aqui sobre o mundo dos clássicos. E muito obrigado a quem nos ouviu. E se quiserem ouvir este ou outros podcasts, podem passar no site do Automóvel Clube Portugal, ir à secção podcast e ouvem lá histórias sobre clássicos ou sobre outros automóveis. Muito obrigado.

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